segunda-feira, junho 14, 2010

As vozes e as vozes, e as confusões

Em se falando de música clássica, vivemos um drama muito engraçado. Não sei em quantos lugares essa piada sem graça se repete, mas venho olhando essas coisas de perto mais e mais, depois de ter me enfurnado mais neste meio de pessoas que cantam, e pessoas que ensinam a cantar.
O problema da "voz dramática", da "voz grande" e da "voz pesada".

Nós sabemos que a primeira preocupação constante de qualquer preparador vocal mais ou menos sensato e não muito frustrado (psicótico) é de fazer com que o aspirante a cantor se sinta bem, sinta facilidade e liberdade ao cantar. Só que tem um tipo, ou tipos, de voz que é difícil, é dura, ou soprada e escura, que não sobe nem desce, não é peixe nem sapo, e quando faz algum som, parece um assassinato no tapa. Desde que comecei a me envolver com canto, tenho visto as mais diferentes formas de voz, e sempre aparecem esses tipos, que infelizmente terminei por me enquadrar.

Passei por alguns professores, e a maioria não sabia o que fazer, não sabia o que dizer, se era tenor isso, barítono aquilo, ou contratenor, sei lá. E depois do ambiente acadêmico (onde as coisas não são, mas tem que ser) a coisa ficou pior ainda - o jacaré-cobra-d'água tinha que cacarejar, voar, nadar, soltar fogo. Eu e todos as outras "vozes-grilo" que estavam por perto.

O grande problema em se lidar com cantores e vozes difíceis, é querer ou precisar de resultados imediatos. Existem pessoas lentas, existem casos lentos. E existem as pessoas rápidas e que melhoram sob pressão. E tem aquelas que quase desmaiam se tomam uma dura. Mas isso no mundo de buscar o resultado a todo custo, isso não funciona, não cola.

É triste, triste, mas isso de fato exclui algumas pessoas do possível, e chega o campo de mercado e de palco apenas pros ágeis de pensamento e super seguros de emoção. Esta com certeza é a grande lição que temos que aprender em todo mercado, mas isto é mais difícil para algumas pessoas que outras - e outros atributos interessantes são simplesmente descartados do foco desses preparadores. Tacam-lhe um rótulo e a maldição da ineficácia.

No final das contas, vivemos uma triste situação do "mais do mesmo". Um preparador (entende-se pessoa versada em pedagogia, a arte de ensinar) deve saber contornar armadilhas psicológicas e situar o aluno em uma direção que esteja de acordo com suas capacidades. Digo sem dúvida ou culpa que estamos cercados de incompetentes professores na área de música clássica, tanto no Rio de Janeiro, como no Ceará, de onde vim, e em vários outros lugares que tenho ouvido falar.

São poucas as exceções de mestres que sabem ver uma pedra bruta e extrair o melhor dali sem destroçar o conteúdo. São poucos os capazes de não carimbar e protocolar. São poucos os capazes de pagar pra ver. Porém, não é pra menos - em um país que é hábito incentivar a mediocridade e adorar tudo que é gringo até não aguentar mais. Tudo que vem de fora é melhor, tudo que os gringos dizem é melhor que o que nós dizemos...

É assim em qualquer coisa: De ginástica olímpica até alpinismo - e no canto não é diferente. O engraçado é ver como os gringos se comportam - um típico estudante de canto clássico americano estuda diariamente, e repete pra si todo dia "yes, I can", como já o incentiva o próprio presidente negão dos USA. E aqui no Brasil, o nosso chavão é "brasileiro não desiste nunca". Não desiste de quê? De fazer a boa merda, e terminar tudo em pizza. É só o que acontece aqui, bater a cabeça na parede e depois se convencer de que se é só mais um - afinal aprendemos isso facilmente em qualquer buraco e com qualquer professor - que somos muito piores que achamos, e que deveríamos nos colocar em nosso lugar: Na lanterninha.

O que eu digo aos colegas "dramáticos" (sejam de voz ou de cabeça) é: Confiem no seu taco, procurem seus terapeutas e amaldiçoem seus inimigos e dificuldades a vontade. A vida para os super emocionais e pioneiros é foda. Mas dá pra conseguir, só não contem com mãozinha na cabeça. Vai ser sempre tapa na cara mesmo...